É apenas uma bola de fogo, queimando até o combustível terminar. Não há nada lá. Também não há nada em Júpiter, nem Saturno, nem nos planetas seguintes. A gente não pode pegar uma nave e pousar lá. São astros gasosos, tão densos quanto o ar. Não há chão, não há atmosfera, não há pista de pouso. Não há nada lá que justifique a viagem (sem volta).
Isso encrustrou na minha cabeça, de uma maneira que me fez relacionar essa triste novidade com tudo que a vida colocava no meu caminho. A tal canção escrita para a guria que não me levava a sério custou, mas deu resultado. Isso me fez feliz por tempo suficiente para descobrir que tratava-se de uma missão sem propósito, um planeta gasoso sobre o qual eu não poderia pousar. Um corpo celeste cuja beleza pode ser observada à distância, em fotos de poderosos satélites que revelam belas e harmoniosas composições de formas e cores, mas que, ao passo em que aproximo minha astronave, essa beleza evanesce em uma fina névoa etérea, sem cheiro, sem cor, sem sabor, sem nada.
A música tem me levado veloz pela galáxia, numa velocidade em que torna-se perigoso o pouso, podendo esse resultar em feridas profundas e ferragens retorcidas projetando-se em velocidades inimagináveis me atravessando o corpo. O medo do acidente inevitável me fez encontrar conforto no sobrevôo sub-orbital, na contemplação distante e no contato mínimo com a infinita quantidade de luas, estrelas, buracos negros, intangíveis oceanos de anti-matéria e planetas que riscam o misterioso horizonte que passa pelas minhas janelas.
No entanto, dia desses orbitei insistentemente um pequeno ponto perdido no cosmo infinito, por vezes até confundindo suas marés, fazendo-as esvaírem vazantes de choro. O vôo progressivamente transformou-se em impensável rasante, de maneira que as leis da física, implacáveis e soberanas em qualquer parte desse Universo, apressaram a inevitável colisão. É quando o plano de vôo mostra-se desprovido de significado, o manobrar do manche não traz resultado e o grito de socorro no rádio não encontra destinatário. Emergência.
É quando chegamos ao eterno agora: eu, astronave desconhecida, sem combustível, destino, nem coordenadas para voltar, pedindo permissão para pouso.
Lucas Silveira.
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